XI - GRAVIDEZ DE RISCO
Eu estava grávida de um menino e acreditava que ele seria nossa redenção. Ledo engano. Mesmo grávida, eu sofria violência física. Muitas vezes eu nem sabia porque estava apanhando. Mas apanhava, chorava e ninguém ouvia. Eu ia trabalhar com o sorriso no rosto, pegando duas conduções pra ir e pra voltar, mas o estresse e esforço excessivo desencadeavam uma série de sangramentos durante a gestação que o médico monitorava. O maior risco se mostrou às 24 semanas.
Acordei com a cama molhada, estava perdendo líquido aminiótico. Marquei uma consulta com o meu médico e ele me falou que a internação deveria ser rápida. Não poderia fazer o parto pois o bebê não aguentaria e precisava rehidratar a bolsa.
Foram 15 dias de internação. Uma vez na semana, meu pais iam me visitar e todos os dias ele ia me visitar. Minha filha ficou com meus pais durante a internação e ele, como estava me acompanhando, pegou a filha dele pra ficar uns dias com ele pra ele não ficar sozinho em casa.
Eu chorava no hospital todos os dias. Rezava pedindo perdão pela minha vida. Que eu merecia o castigo, mas meu filho inocente não poderia ter sua vida em risco por eu ser fraca.
Após 15 dias eu tive alta. Perdi 5 quilos porque não conseguia me alimentar direito no hospital. Eram 4 bolsas de soro por dia. O médico me pediu que me afastasse do trabalho. Qualquer excesso eu poderia perder meu filho.
Entrei com um pedido de 45 dias de licença médica. Meus chefes eram boas pessoas e falaram que iriam pagar meu salário normalmente e que não precisava dar entrada no INSS pois poderia demorar sair o benefício.
Sem o trabalho, ficava mais sozinha do que nunca. Levava minha filha na escola e passava a tarde sozinha. Tive um final de gravidez muito triste. Ele só chegava a noite, como eu já não saía pra lugar algum, nem trabalhava eu não apanhava.
Uns dias depois minha irmã marcou o casamento. Ela iria casar com o melhor amigo do meu ex. Com relutância ela convidou meu novo marido também. Eu sabia que eu teria problemas naquela festa. Minha filha seria dama de honra. Compramos as roupas e fomos no casamento da minha irmã. Eu já estava com 7 meses de gravidez. Teve atraso na cerimônia e a festa começou mais tarde. Ele foi impaciente, queria embora porque não tinha comida. Falou que ia pedir um taxi e que iríamos embora. Chamei minha filha pra ir embora. Ela chorou e correu pros braços do pai dela. Fui tentar conversar com ele que eu não estava me sentindo bem e que ia embora. Ele falou que ficava com ela. Observei do outro lado do salão de festa, meu atual marido me fuzilando com os olhos. Fui até ele, dizendo que já poderíamos ir, mas que minha filha ficaria na festa com o pai dela.
Pegamos o taxi e fomos pra casa. No caminho ele foi quieto durante todo o trajeto, mal eu sabia o que estava prestes a acontecer.
Quando abri a porta de casa, ele já me deu um tapão no rosto. Lembro que caí por cima da minha barriga. Fui chorando até o quarto pra tirar a roupa da festa e colocar uma camisola para dormir. Aos gritos ele me chamava de vagabunda e piranha, tomei mais tapas no rosto. Ele me apertou o pescoço. Pedi pra parar. Estava grávida e com uma gravidez de risco. Ele parou. Falou que não iria dormir com uma vagabunda. Pegou o travesseiro dele e foi dormir no sofá.
No dia seguinte era domingo. Ele estava arrumando umas camisas numa sacola e pegou o cachorro dizendo que iria embora. Eu não impedi. Ele ficou sentado na varanda durante horas e dali não saiu. Eu chorei. No meu quarto desabei. Eu merecia aquilo. Mas meu filho não.
Ele veio atrás de mim, pediu perdão. Disse que nunca mais aquilo ia acontecer. Nos reconciliamos naquela noite.
No dia seguinte ele foi trabalhar e trouxe pra mim de presente um anel de ouro com uma pedra azul. Disse que eu era o amor da vida dele e não queria me perder. Eu acreditei.
Devido à minha fragilidade física durante o final da gravidez ele parou de me bater. Acreditei que finalmente ele tinha mudado. Que poderíamos ter uma vida feliz.
Chegou o dia do aniversário da minha filha, fizemos uma festinha na casa da minha mãe. Com família, colegas de trabalho, enfim, nossa vida voltava à normalidade.
No dia seguinte, eu tinha um exame de pré Natal agendado. Seria a ultrassom morfológica. Ele foi comigo. Na clínica, a médica não fez uma cara muito boa quando viu o resultado do exame. Pediu para eu ver meu médico imediatamente, que era uma urgência. Era 12h, hora do almoço, meu médico estaria no consultório a partir das 13h. Pedi ao meu marido pra almoçar, ele estava preocupado, disse que era melhor não, porque não sabia o que o médico iria fazer. Paramos num restaurante para comer. Eu almocei bem. Quando chegamos no consultório, meu médico olhou o exame e disse que meu filho estava com o cordão umbilical em volta do pescoço e estava em sofrimento fetal. Eu poderia perder meu filho. Meu médico desmarcou todas as consultas que tinha naquele dia e nos levou no seu carro até o hospital para eu fazer a cesária na 32ª semana de gestação. Era um parto de risco, meu filho ia precisar de uma UTI neonatal. Meu filho nasceu no dia 04 de outubro de 2004 às 14:30h da tarde. Eu não ouvi o choro. Apenas a correria dos médicos para tirá-lo de perto de mim. Onde está meu filho? Perguntei ao médico. Ele falou que ele precisava ir pro respirador, que eu logo iria vê-lo.
Só vi meu filho no dia seguinte. Quando eu podia me locomover até a UTI. Meu filho era pequeno, respirava com dificuldade, mas estava vivo. Meu marido não saía do hospital. Não sei se preocupado ou com culpa.
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