XXII - MORANDO NO RIO DE JANEIRO
Pedi um ano de licença sem vencimento do meu trabalho e em fevereiro de 2014, nos mudamos para o Rio de Janeiro. Foi muito ruim para mim e para as crianças se adaptar. Eu gostava muito do bairro em que morávamos, mas detestava o bairro em que trabalhávamos. Trabalhávamos em uma fábrica de salgados em Rio das Pedras. Lugar feio, sujo, sem saneamento básico e fora as duas conduções que precisávamos pegar para o trabalho.
Matriculei as crianças em nova escola, como a escola era próxima de casa, minha filha, na época com 12 anos, ia pra escola com o irmão e a tarde ficavam sozinhos até a gente chegar a noite. Deixava almoço pronto, material de lanche, lanche de escola, mas o principal eles não tinham: a gente em casa. Para compensar os finais de semana eram dedicados à família, íamos ao zoo, as feiras, parques, visitávamos pontos turísticos, almoçávamos fora.
Ficamos uns meses trabalhando naquela fábrica que eu odiava. Íamos pra Arraial somente nos feriados e meu relacionamento com minha família passou a ser por telefone. No Rio, meu marido tinha irmãos, mãe, filha, eu não tinha ninguém.
Depois de um tempo, começamos a trabalhar com a filha dele nas festas que ela produzia aos finais de semana. Era um dinheiro extra que entrava, mas nada pagava meus momentos com meus filhos.
Nossa rotina passou a piorar quando a filha dele saiu da sociedade da fábrica e nos deixou a ver navios no meado do ano. Fizeram-nos a proposta de ficar administrando uma das lojas no Complexo do Alemão. Nós pagávamos aluguel, meus filhos estudavam em escola particular, estávamos no meio do ano e eu não poderia voltar ao Porto nem pra Arraial ainda.
Foi a época mais solitária da minha vida. Minha depressão voltava, agora eu não tinha mais os médicos, nem mais as receitas para as medicações, a depressão piorava. Ganhei mais de 10 kg em 2014.
Assumimos a loja, durante os primeiros meses lucramos bastante e começamos a equipar melhor nossa casa. Com o tempo, a violência do morro nos fazia deixar a loja fechada por dias e o prejuízo começou a bater na porta. Para piorar, numa manhã, ele foi abrir a loja sozinho, já não tínhamos mais grana para os funcionários e ele foi abordado por dois bandidos. Destruíram nosso sistema de câmera, roubaram o pouco dinheiro que tinha na loja, amarraram e deram uma surra no meu marido.
Ele foi encontrado por uma das nossas ex-funcionárias. Ele me ligou, disse que estava com a Polícia na loja e que estava machucado. Minhas pernas tremeram na hora. Deixei meus filhos com uma vizinha e fui pegar duas conduções para socorrê-lo. Nem comerciantes locais, nem policiais o levaram ao hospital. Ninguém quis se envolver. Primeiro, pegamos o teleférico para ir na Delegacia fazer o BO e depois pegamos mais uma condução para levá-lo na UPA. Naquele dia percebi que Rio de Janeiro não era pra principiantes. Eu queria ir embora. Não tínhamos mais grana pro aluguel da loja, nem o aluguel da casa, mal tínhamos grana para comer... Após muito custo eu comecei a convencê-lo a voltar para Arraial. Combinamos que voltaríamos após as festas de final de ano, onde as vendas poderiam aumentar e em fevereiro já poderia pedir minha reintegração no Porto.
No dia 24 de dezembro após entregar as encomendas de salgado na loja, pegamos as crianças e fomos pra Arraial para passar Natal com meus pais. No dia 26 ele retornou ao Rio para que a loja funcionasse até o Reveillon e levaria nossa mudança de volta pra casa. Entregamos a casa que morávamos e ele ficou algumas semanas com a mãe dele no Rio até as coisas se resolverem. Pra trazer nossa mudança foi necessário pedir dinheiro emprestado à minha família.
Lembro de falar com ele que nossa ida ao Rio não tinha valido a pena, que se ele quisesse ficar se aventurando, poderia, mas eu estava indo embora com meus filhos. Perdemos um ano. 1 ano do trabalho que conquistei, minha promoção... Perdi minha sanidade mental naquele lugar.
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